quarta-feira, 27 de abril de 2016

CLAUDOMIR TAVARES: Jacarecica, a história de um povo



Claudomir Tavares da Silva[1]
Ariovaldo Antônio Tadeu Lucas[2]
I – INTRODUÇÃO

A história das sociedades humanas, até hoje, gira em torno das perguntas que conseguimos formular, mas é movida, principalmente, pelas respostas que conseguimos encontrar a estas indagações. A ciência, por sua vez, teima em se mostrar dinâmica, introduzindo novos elementos a estas descobertas, constituindo-se numa simbiose perfeita, o que proporciona uma relação contínua fantástica.

Ao longo da história da humanidade, tem se verificado a opção dos povos, em todos os continentes da Terra buscaram ocupar terras banhadas por rios, principalmente aqueles mais caudalosos, em cujas margens formaram-se as condicionantes para a prática de atividades que lhes proporcionem suas sobrevivências.

Em função desta presença humana, constituíram-se as grandes civilizações da antiguidade, o que não se fez diferentes nos períodos subsequentes, dada abundância de água para a prática da atividade pesqueira, fertilidade dos solos, para a prática da agricultura, as condições favoráveis a navegação, elementos essenciais para a manutenção da vida na Terra.

Estabelecendo um paralelo histórico, ao tempo em que resguardadas as necessárias proporções, esta foi condição adotada na ocupação do território sergipano, notadamente onde está localizada o que convencionamos chamar de Bacia Hidrográfica do Rio Sergipe, onde atualmente está presente o maior contingente populacional do Estado, encontrando-se nela a Sub-Bacia do Rio Jacarecica, marcado pela presença de três barragens, integrada por cinco municípios, a saber: Ribeirópolis, Itabaiana, Areia Branca, Malhador e Riachuelo.

O Rio Jacarecica, que denomina a Sub-Bacia, nasce na região da Terra Dura, em Ribeirópolis, e deságua no Rio Sergipe, que estende a denominação a bacia, na sede do município de Riachuelo. Aqui, sem pretensão de esgotar o tema, apresentar-se á possíveis respostas as questões referentes à área geográfica da sub-bacia hidrográfica, associando-a necessariamente aos desdobramentos mais significativos que caracterizaram a história de seu povo.

2. A OPÇÃO PELAS MARGENS DOS RIOS

Ao buscar entender o que une o povo fixado na área geográfica da sub-bacia do Rio Jacarecica, compreendendo suas particularidades, suas manifestações, suas aspirações e sonhos, proporcionou estabelecer uma relação do processo histórico indissociável em torno da sua ocupação e permanência.

Tomando o exemplo das antigas civilizações da humanidade, não é difícil concluir qual a opção dos povos do Egito, da Mesopotâmia, da Índia, da China, ou mesmo da América, em ocupar primariamente as margens dos grandes rios (e outros nem tantos) localizados nestes pontos distintos da Terra, dada as possibilidades neles aferidas, como água para consumo, terra fértil para a prática da atividade agrícola, leito para o exercício da pesca e a navegação, entre outros condicionantes essenciais para a sobrevivência destas populações.

“Para entendermos como surgiram as primeiras grandes civilizações da humanidade, precisamos compreender como nasceram às primeiras cidades. Também sendo importante entender a importância que os rios tiveram neste processo.” (FABER, 2011. P. 3).

A ocupação do território sergipano é datada do Holoceno (12000 AP[3]), sendo a maioria dos povoadores do território que corresponde atualmente a Sub-Bacia Hidrográfica do Jacarecica classificada entre os ceramistas (5.000 anos AP ao presente), estando o município de Riachuelo incluído entre aqueles em que foram verificadas a presença das culturas pré-históricas em Sergipe, na sua tradição Aratu[4] (CARVALHO, 2000. p. 29).

De acordo com Nunes (2006: 19), “a divisão do Brasil em Capitanias Hereditárias em 1534, integrou o território sergipano à Capitania da Bahia de Todos os Santos, concedida a Francisco Pereira Coutinho por Carta de Doação de 05.04.1934, e regulamentada por Foral de vinte e dois de agosto do mesmo ano. Abrangia ela 50 léguas de terra, que se estendiam da foz do São Francisco à Ponta do Padrão em Salvador”.

A conquista do território de Sergipe “foi a consequência da expansão colonizadora da Bahia para o norte (...) veio acabar com a solução de continuidade territorial que separava Recife da Bahia, que se constituíam como os únicos pontos de povoamento existentes ao norte (...) Bahia era o centro do governo colonial e Recife recebia o influxo de sua ação, não só sob o ponto de vista político e social” (FREIRE, 1995. p. 15), e seu efeito imediato “foi à ocupação da terra, desde o Real até o São Francisco, no movimento sul para o norte, com ocupação transversais, junto aos afluentes dos grandes rios: Real, Piaui, Vasa-Barris, Cotinguiba, Japaratuba e São Francisco. (BARRETO, 2002. p. 49).

“A ocupação do território da bacia do rio Sergipe começou em 1594, quando Tomé Fernandes localizou-se além das margens do Cotinguiba. Em seguida foram ocupadas as terras junto ao Comendaroba, ao Ibura, ao Aracaju, ao Cotinguiba e ao Sergipe, ocupando áreas onde nasceu a lavoura de cana-de-açúcar, que transformou a região na mais rica de Sergipe.” BARRETO, 2002. p. 49)

Considerando que “os rios que banham o território sergipano são agrupados em seis bacias principais: São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Vasa-Barris, Piaui e Real, o povoamento do território sergipano e as atividades econômicas que o impulsionaram foram marcadas por esta diversidade geográfica.” (NUNES, 2006. p. 106).

Foram os criatórios de gado quem abriu as portas para a ocupação das terras além do litoral, ao longo do rio Sergipe e seus afluentes eram vinte e oito proprietários de currais de gado.

“A ocupação das terras ao longo do rio Sergipe permitiu, a partir de 1600, a presença de dezoito sesmeiros, em poucos anos, continuando por todo o éculo XVII, quando os criadores de gado expressavam a pujança sergipana.” (BARRETO, 2007. p. 49).

Mas esta atividade não lograria êxito, não fosse a presença do rio Jacarecica e seus tributários cujo conjunto que forma a sub-bacia constituí-se em elemento essencial ao desenvolvimento desta atividade e daquelas que foram desenvolvidas na sequência ou concomitantes. 

3. E SURGEM AS CIDADES

É percorrendo as lembranças de parte destas pessoas (camponeses, pescadores, fazendeiros, etc.), cominados com o aferimento nas fontes bibliográficas disponíveis, que procurou-se conhecer outra visão sobre os elementos histórico-culturais da sub-bacia do rio Jacarecica, notadamente naquilo que pretende-se debruçar, conhecendo outra maneira de re-construir a história

“O desenvolvimento da colonização da Capitania de Sergipe se processou dentro da política mercantilista ibérica dominante, visando a levar grandes rendimentos ao Tesouro Real. Buscava-se desenvolver a agricultura que resultasse em produtos solicitados pela economia europeia em plena expansão trazendo bons lucros. (...) Grande foi à corrida inicial de colonos pela posse da terra sergipana. Entre os anos 1596 e 1607, Felisbelo Freire registrou a doação de 205 sesmarias.” (NUNES, 2006. p. 37).

Indispensável dizer que este “surto” inicial de ocupação do território sergipano, consoante as afirmações de Maria Thetis Nunes (2008), respingaria necessariamente na região formada em torno da sub-bacia hidrográfica do Rio Jacarecica, verificando-se a partir dali a formação dos primeiros núcleos populacionais.

São datadas do século XVII a criação de novas freguesias, entre as quais a de Santo Antônio e Almas da Vila do Itabaiana (AMARAL, 1998. p. 14). A partir daí, foram várias as povoações que começam a ganhar vida em Sergipe, a exemplo daquelas que dariam origem as atuais cidades de Areia Branca, Malhador, Riachuelo e Saco do Ribeiro (Ribeirópolis).

“O surgimento das cidades brasileiras está ligado à questão religiosa. O aparecimento de uma freguesia, de uma vila ou de uma cidade sempre esteve relacionada diretamente com a Igreja Católica. O marco inicial de uma cidade – a construção de uma igreja – a princípio apresentava-se com uma arquitetura simples e rústica. A partir desse marco, as vielas, ruas e praças começaram também a organizar-se. (...) A estrutura urbana que surgia dava origem aos chamados povoamentos. (...).” (MARX, 1991. Apud NUNES, 1994. p. 7).

Seguindo uma tendência do que ocorria no Brasil Colonial, o surgimento das cidades em Sergipe no período que vai do século XVII ao final do século XIX apresenta as mesmas características, a partir dos interesses do Estado ou da Igreja.

“Muitas vezes a distância entre o povoado e a cidade fazia com que o primeiro fosse elevado a categoria de vila ou cidade por interferência da Igreja, pois a partir daquele momento a comunidade teria a permanência de um padre, evitando assim o deslocamento dos fiéis para outra localidade com o intuito de participar de ofícios religiosos.” (NUNES, 1994. p. 9)

A presença de um rio, condição que proporcionava a escolha dos territórios em que seriam ocupados, associada no caso da sub-bacia do Rio Jacarecica, esteve associada com edificação de um núcleo habitacional em cujo centro ou parte mais elevada, era demarcado com a construção de uma Igreja, quase sempre, marco inicial dos sítios históricos em que surgiram as cidades e povoados desta região.

4. AS CIDADES DO JACARECICA

A formação e desenvolvimento (econômico e social) dos municípios sergipanos são marcados pelo privilégio de uns em detrimentos de outros, sendo vários os elementos que contribuem para isso, como o fato de serem fontes geradoras de recursos para o Estado, seja pela presença da indústria ou ainda pela produção agrícola ou pela presença de alçaram aos recursos minerais.

Mas ao lançar-se um olhar sobre o passado destes municípios (neste caso, nos referindo aos localizados na sub-bacia do Jacarecica), verifica-se que as cidades não conseguiram alcançar este grau de desenvolvimento na mesma proporção, se configurando hoje como apêndices daquelas que obtiveram um padrão mais consistente e ascendente (com destaque para Itabaiana que conseguiu sobrepor-se aos demais).

É preciso então, entender inicialmente em que circunstâncias estas (cidades e povoados) surgiram e a partir daí estabelecer um paralelo, identificando as semelhanças (e diferenças) no processo de constituição do que convencionou-se classificar de Sítio Histórico. Neste sentido, faz-se necessário entender que o surgimento das primeiras cidades na Sub-Bacia Hidrográfica do Jacarecica não ocorreu de forma homogênea, uma vez que, ainda que muito próximas uma das outras, verifica-se que em estas nasceram dentro de características bastante peculiares.

4.1. Itabaiana

As informações obtidas junto a Biblioteca do IBGE (2012), que reúne elementos coletados junto a instituições municipais, indicam que a colonização e povoamento de Itabaiana tiveram início após a conquista do território sergipano por Cristóvão de Barros, em fins do século XVI efetivando-se a posse das terras (sesmarias) pelos colonos gradativamente, por cartas de doação, nos séculos XVI e XVII, e alvarás, no século XVIII. [5]

O primeiro contato com os nativos de Itabaiana[6] deu-se quando em 1586 os franceses que tentaram conquistar a Bahia procuraram estabelecer uma relação de amizade com os indígenas, recrutando-os para este embate. De lá para cá, um lastro histórico, até o momento em que se dará a construção a partir de 1675 a Igreja que deu origem atual matriz de Santo Antônio de Almas de Itabaiana, a elevação a condição de vila em 1665 e finalmente a categoria de cidade em 28 de agosto de 1888[7].

Na trajetória histórica de Itabaiana constam lendas que a associam a busca das minas de prata, originária a partir da atuação de Belchior Dias Moréia e de salitre nos sertões de Sergipe, as quais inspiraram José de Alencar a escrever em 1862 o romance “As Minas de Prata” e Paulo Setúbal, em 1935 o “Romance da Prata”

No caso do povoamento de Saco do Ribeiro, atual Ribeirópolis, está intimamente ligado ao surgimento da Vila de Itabaiana, datando segundo Santos (1987: 11) do derradeiro decênio do século XVII, até quando alcançou sua emancipação política em 18 de dezembro de 1933, sob a denominação de Ribeirópolis, que vem tentando se enquadrar no contexto das cidades progressistas de Sergipe.

4.2. Malhador

Nas informações levantadas por Ariosvaldo Figueiredo (1976), o nome Malhador surgiu por conta do gado que pastava na região e que ao entardecer procurava um lugar no tabuleiro para descansar e ruminar[8]. “Muitos não gostaram do nome, mas a história, mais forte, não deixou ninguém mudá-lo. Tentaram, mas de uma vez, chamá-lo de São José, padroeiro do lugar, porém não pegou, não colou. O tempo correu, o nome ficou”. (FIGUEIREDO, 1976. p. 17). Alcançou emancipação política em 25 de novembro de 1953.

4.3. Areia Branca

Quanto ao topônimo de Areia Branca está ligado à coloração do solo, o que indica a provável existência de praia em tempos remotos. A povoação teria se iniciado no quadrado em frente à capela que se transformou depois na Igreja Matriz São João Batista, nome do padroeiro dos areiabranquenses. Muito tempo levou para formar-se o povoado, que passou a ter registro na história como município no dia 11 de novembro de 1963, quando foi emancipado de Riachuelo, cujo território fora desmembrado deste município e mais dos de Itabaiana e Laranjeiras, com os quais se limita[9]

4.5. Riachuelo

Também as informações do IBGE apontam que o núcleo primitivo do atual município de Riachuelo foi inicialmente pouso de tropeiros, no roteiro entre os centros açucareiros mais amigos, de Laranjeiras e Divina Pastora. Com a vinda da família Pintos teve início a aglomeração conhecida como "Povoado dos Pintos", que foi elevado, em 1837, à categoria de freguesia (Nossa Senhora da Conceição do Riachuelo) e, em 1874, à de Vila e Município com a denominação de Riachuelo. Riachuelo foi até fins do século XIX, um dos centros mais importantes da Província, depois Estado de Sergipe, devido, sobretudo, à sua indústria açucareira[10].

5. OS POVOS JACARECICA:

Lançando mão da historiografia sergipana, a despeito da presença humana em nosso território, nos damos conta de que este fora habitado por diversas tribos indígenas, sendo que Mott (1986: 18. p. 19) documenta a presença de brancos, pardos, negros e indígenas como integrantes da etnia sergipana no século XVIII, tendo sido estes grupos fundamentais na formação histórica e cultural dos diversos municípios, entre os quais aqueles em questão neste trabalho.

“Quando a Capitania de Sergipe encerrou a etapa colonial, a população de cor livre era numerosa, fato que em desafiado os estudiosos em busca de explicação (...). Também era numerosa a população branca, existindo um branco para cada pessoa de cor”. (NUNES, 2006. p. 243).

Vivem atualmente nos cinco municípios da sub-bacia do rio Jacarecica 143.294 habitantes[11], ocupando uma área de 923 km² (BOMFIM, 2002), numa densidade demográfica de 155,21 hab/km² (Areia Branca: 16.857 hab – 147 km², Itabaiana: 86.967 hab – 337 km², Malhador: 12.042 hab – 101 km², Ribeirópolis: 17.173 hab – 259 km² e Riachuelo: 9.355 hab – 79 km²).

Quando Marx (1982) afirmava que “a economia é o motor da história”, ele não se referia especificamente ao “modo de produção” do homem da Sub-Bacia Hidrográfica do Jacarecica, mas o conceito emitido de “motor”, está associado ao fato de ser esta a engrenagem que tem movido a vida das sociedades ao longo da história da sociedade, acrescentando que esta se dá através “da luta de classe”. Resguardando as devidas e necessárias proporções, o elemento econômico, moveu a história de vida dos povos do Jacarecica, sendo na atualidade fatores de identidade cultural.

Das primeiras atividades econômicas praticadas a partir da colonização das terras de Sergipe del Rei, foi à pecuária aquela que se deu como a impulsionadora da ocupação do território da sub-bacia hidrográfica do Jacarecica, pois “antes do sergipano ser agricultor foi pastor” (FREIRE, 1977. p. 176). “A pecuária permitiu o acesso a terra de uma parte da população mais pobre”. (GUIMARÃES, 1981. p. 72).

5.1. Aspecto sócio-econômico

No município de Areia Branca, as atividades econômicas “tem suas bases nas atividades agrícolas, pecuárias, comerciais, minerárias e avicultura. Na agricultura, destaque para a produção de mandioca, cana-de-açúcar, manga, maracujá, milho e laranja. A pecuária está voltada para a criação de bovinos, suínos e muares. A avicultura, de porte reduzido, é voltada a criação de galináceos. Na mineração, destaque para a exploração de petróleo/gás, e também lavras de areia.” (BOMFIM, 2002. p. 4).

Um dos mais importantes centros sócio-econômicos do estado, o município de Itabaiana “tem uma das principais economias do Estado, com nível elevado de empregos nos setores de serviço, indústria e comércio. A mineração também contribui para a economia, com a atividade de lavra de pedreiras. A agricultura tem como principais produtos, a mandioca, batata doce, manga, tomate, laranja e feijão. Na pecuária, os principais efetivos são os bovinos, suínos e ovinos; enquanto na avicultura, destacam-se os galináceos.”. (BOMFIM, 2002. p. 4).

A base econômica do município de Malhador está relacionada “as atividades agrícolas (mandioca, batata doce, maracujá e laranja), pecuárias (bovinos, equinos e muares) e avicultura (galináceos).” (BOMFIM, 2002. p 4).

O município de Riachuelo tem suas bases econômicas fincadas na “agricultura (cana-de-açúcar, coco, mandioca e manga), pecuária (bovinos, muares, suínos e equinos), avicultura (galináceos), comércio, indústria e mineração (exploração/produção de petróleo e gás; lavra e garimpo de areias).” (BOMFIM, 2002. P. 4).

Já o município de Ribeirópolis encontra sua base econômica pautada na “agricultura (mandioca como principal produto, e em menor escala o milho e o feijão), pecuária (bovinos, suínos, ovinos e equinos) e avicultura (galináceos). A indústria e o comércio no período de 1980 a 1991 registraram um decréscimo, no que se refere ao nível de empregos e número de estabelecimentos.” (BOMFIM, 2002. p. 4).

Algumas das atividades econômicas destes municípios remontam do período colonial e tem uma relação com o desenvolvimento econômico que norteou toda a trajetória destes municípios, a exemplo da agricultura (mandioca) e da pecuária (criação de gado). A monocultura da cana-de-açúcar, cuja finalidade era voltada para o negócio agroexportador, em especial, atualmente tem no agronegócio promovido pelos usineiros a substituição dos engenhos coloniais, alguns dos quais existentes até o final do século XIX.

Atualmente a monocultura da cana-de-açúcar, presente principalmente no município de Riachuelo e parcialmente no de Malhador é o resultado de um avanço que se dá em patamares acelerados, no que requer uma discussão acerca dos impactos que esta tem provocado, devendo ser estabelecido um paralelo na relação custo (para a maioria)-benefício (de uma minoria).

“O grau de produção da população depende de como as pessoas buscam a sua subsistência, do tamanho do território e outros fatores, e varia de acordo com o nível material do desenvolvimento e com as relações sociais operantes. (...) Assim, o contingente populacional não é responsável, em si, pela degradação ambiental presente em várias regiões do planeta. Ao contrário, o crescimento desordenado da população reflete a falta de investimentos nas regiões em que se dá, gerada pela tendência desigual e excludente do capitalismo”. (SERRA, 2012. p. 148).

Do ponto de vista comercial, é a cidade de Itabaiana, outrora destaque na produção algodoeira, dentro das culturas de exportação no período colonial, um dos maiores centros comerciais do interior de Sergipe, cuja feira é referência como a maior do Estado.

“As feiras ocuparam lugar destacado na vida econômica sergipana. Tradição portuguesa trazida pelos colonizadores, seu estabelecimento já estava previsto no Regimento de Tomé de Souza”. (NUNES, 2006. p. 171).

5.2. Aspecto religioso

Além das semelhanças e diferenças verificadas observando através dos elementos sócio-econômicos, nenhum como o aspecto religioso é maior fator de unidade cultural das comunidades residentes nas sedes dos municípios como em seus povoados, repetindo-se aí uma tendência nacional, sendo o Brasil a maior nação católica do mundo.

“O catolicismo no Brasil impressiona pelos números e pela fé. O país é a maior nação católica do mundo e abriga metade dos fiéis da América Latina. Traduzindo em números, são cerca de 145,4 milhões de brasileiros que se declaram fiéis à Igreja comandada pelo papa Bento 16, de acordo com dados de 2005 da CNBB. Isso corresponde a 78,95% da população.” (GUIMARÃES, 2013).

Apesar do crescente número das religiões evangélicas, é numeroso o contingente de católicos nos municípios integrantes da sub-bacia hidrográfica do Jacarecica, verificando-se a presença de uma religiosidade popular bastante forte, tendo como ponto alto das manifestações as festas dos padroeiros, cujos santos são bastante populares entre as comunidades.

Tendo como padroeiro São José, a cidade de Malhador pode se dizer assim que abre em Sergipe o Ciclo Junino, ao celebrar e homenagear aquele que é além do padroeiro dos católicos da sede do município, o santo da fertilidade, o protetor dos agricultores, principalmente a partir a ligação de sua população com a terra.

A cidade de Itabaiana tem como padroeiro um dos mais populares e celebrados santos da Igreja Católica, Santo Antônio, em torno do qual a Paróquia de Santo Antonio e Almas promove dentro do trezenário a tradicional procissão dos caminhoneiros, dada a alcunha de ser a cidade a “Capital Nacional do Caminhão”.

Em Areia Branca, os católicos depositam suas devoções em torno de São João Batista, o que tem lhe proporcionado a realização de um dos mais representativos festejos juninos do Estado, valendo-lhe a classificação popular de São João de Paz e Amor, uma vez que durante o período festivo fica proibido o uso de fogos de artifícios por populares.

Ponto alto do calendário religioso de Ribeirópolis, a festa do padroeiro Sagrado Coração de Jesus acontece na segunda quinzena de outubro, sendo marcada pelo que de mais intimo do ponto de vista da relação de fé e religiosidade popular há entre os católicos não apenas daquela cidade, mas de fiéis que para lá se dirigem.

Encerrando o que podemos chamar de Ciclo Religioso do Jacarecica, é a festa de Nossa Senhora da Conceição, padroeira de Riachuelo, uma das mais tradicionais de Sergipe, dividindo as atenções com outras que se realizam em outros municípios, incluindo aí a capital, Aracaju.

5.3. Aspecto Político

A primeira forma de organização política na vida sergipana após a colonização foi à distribuição de sesmarias doadas nos primeiros anos desta condição política, cuja ocupação da terra se dava no sentido sul-norte, do Real ao São Francisco, como consequência das prioridades da administração colonial.

Atestando o desenvolvimento econômico, a Igreja, por sua vez, se fez presente na estruturação política, a partir da divisão eclesiástica no sentido de melhor atender a população e principalmente seus interesses na região, criando em 1675 a paróquia de Santo Antônio e Almas de Itabaiana.

“Até então só existia a paróquia de N. Sra. Da Vitória sediada em São Cristóvão desde os primórdios da colonização. Naquele ano (1675), o Arcebispo da Bahia criava a paróquia de Santo Antônio e Almas de Itabaiana; e em 1678, a Freguesia de Santo Antônio de Vila Nova do Rio São Francisco era desmembrada da Paróquia de Nossa Senhora da Vitória, e criada a Paróquia de Santo Antônio do Lagarto; em 1680, desmembrando-se a Paróquia de Santa Luzia do Itanhy da Paróquia de Santo Antônio de Pitanga na Bahia”. (NUNES, 2006. p. 279).

Dentro da política administrativa da metrópole [12], são criadas em 1697 as primeiras vilas sergipanas, entre as quais a de Santo Antônio e Almas de Itabaiana, juntamente com as vilas de Nossa Senhora da Piedade do Lagarto, Santa Luzia do Itanhy e Santo Amaro das Brotas, sendo estas os embriões das primeiras cidades sergipanas.

Ainda que suas existências sejam anteriores, suas organizações político-administrativas tenham sido reguladas por leis do Império (Itabaiana) e da República (Areia Branca, Malhador, Riachuelo e Ribeirópolis), estas só começaram a se constituir politicamente como as conhecemos atualmente no século XX, passando todas elas a partir daí a ser administradas por prefeitos municipais.

Apesar de criado pela resolução provincial nº 1.331 datada de 28.08.1888, Itabaiana só elegeu seu primeiro prefeito em 1935 (estando atualmente na sua 24ª gestão), sendo antes administrada no período de 1990 a 1935 por intendentes (32 gestões) [13].

Dada à importância política e econômica de Itabaiana, principalmente, as disputa políticas (eleitorais) tendo sido estas marcadas por episódios que ficaram impressos na história, “coube a Itabaiana o triste título de local das mais memoráveis eleições do cacete da História de Sergipe” (MENEZES, 2010), episódio que ficou conhecido como a “Eleição do Cacete” (eleição para vereadores e juízes de paz).

“Os episódios de 1848 mostram que os males das rivalidades e da polaridade política têm longa trajetória no torrão serrano. (...) A vila ainda registraria outras batalhas eleitorais em 1856, 1863, 1868 e 1872, porém nenhuma dessas com a intensidade.” (MENEZES, 2010).

Antes de Itabaiana, o município de Riachuelo já havia sido criado em 31 de abril de 1874, através da Resolução Provincial nº 964, cominados com o Decreto Estadual nº 10 de 25 de janeiro de 1890. Contribuiu para isso o grande crescimento econômico alavancado principalmente pelo cultivo da cana-de-açúcar, elevando em maio de 1872 o povoado Pintos a condição de Freguesia de Nossa da Conceição de Riachuelo, evoluindo dois anos depois a condição de Vila de Riachuelo, quando deixou de pertencer ao município de Laranjeiras.

Os demais municípios integrantes da sub-bacia hidrográfica do Jacarecica (Ribeirópolis, Malhador e Areia Branca) foram constituídos na segunda metade do século XX, experimentando o primeiro a modalidade de administração através de intendentes, enquanto os segundos exclusivamente por prefeitos.

O município de Ribeirópolis foi criado em 18 de dezembro de 1933, deixando de chamar-se Saco do Ribeiro e passando a chamar-se a partir de então Vila de Ribeirópolis, sendo administrado de 1º de janeiro de 1934 a 15 de dezembro de 1934 por três intendentes e a partir daí por prefeitos eleitos, mas somente em 28 de março de 1938 a vila alcançou o status de cidade.

Na história política do município de Ribeirópolis, impossível não registrar a longevidade da família Passos, cujo patriarca, Francisco Modesto dos Passos (Chico Passos) foi além de prefeito, deputado estadual por oito mandatos consecutivos. Na “esteira” de sua trajetória de político bem sucedido do ponto de vista eleitoral, seu filho, o advogado Antônio Passos Sobrinho foi prefeito por duas vezes estando exercendo seu quarto mandato de deputado estadual. Sua esposa, a psicóloga Fátima Regina Céspedes Passos foi à primeira mulher a eleger-se prefeita daquele município, sendo reeleita para o mesmo mandato.

Enquanto isso, os municípios de Malhador e Areia Branca tem sua emancipação política cravada na segunda metade do século XX, sendo o primeiro criado pela lei estadual nº 525-A de 11/11/1963 e o segundo através da lei estadual nº 1.254 datada de 11/11/1963, ganhando ambos a partir daí autonomia política administrativa de fato e de direito.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

O presente trabalho permitiu confirmar que a história das sociedades humanas, até hoje, gira em torno das perguntas que conseguimos formular, mas é movida, principalmente, pelas respostas que conseguimos encontrar a estas indagações.

Acrescenta-se a este fator histórico, o elemento religioso como impulsionador a constituição das cidades – desdobramento das povoações iniciadas no século XVII, associado à expansão da colonização sergipana, a partir da divisão do território em sesmarias e na consequente criação de gado.

O desenvolvimento econômico ao longo da história da presença humana na sub-bacia hidrográfica do rio Jacarecica está associado ao seu vínculo com a terra (estabelecendo sua relação com o rio) e daí desdobrando-se nos mais diferentes elementos, que se completam.
Indispensável dizer que este trabalho não se pretende conclusivo, mas nasce na perspectiva de “provocar”, no sentido benigno da palavra, o estudo não apenas sobre a História do Povo Jacarecica, mas as mais distintas variáveis que sugere o tema.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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CARVALHO, Fernando Lins de. A pré-história sergipana. Aracaju: UFS, 2000.
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[1] Estudante da Especialização em Gestão de Recursos Hídricos. Universidade Federal de Sergipe. claudomir21@bol.com.br
[2] Prof. Dr. UFS, Departamento de Engenharia Agronômica, Cidade Universitária “Prof. José Aloísio de Campos”, São Cristóvão, SE, 49100-000, Tel: (79) 2105-6983, aalucas@ibest.com.br
[3] AP – significa “Antes do Presente” que, por convenção, é 1950. Trata-se de uma menção à descoberta da técnica de datação através do carbono 14, que se deu em 1952. As referências cronológicas obtidas através de métodos físicos são sempre acompanhadas de suas respectivas margens de erro, que são expressas com o sinal positivo (+) e o negativo (-)
[4] As culturas pré-históricas sergipanas são classificadas em Canindé (9.000 AP-), Aratu (800 a 1700) e Tupiguarani (900 a 1900)
[6] Seu topônimo é de origem tupi-guarani e significa “pedra grande”.
[11] Consoante dados do IBGE em 2007.
[12] Portugal
[13]Nos referimos a gestões e não gestores, uma vez que alguns deles estiveram à frente da administração por mais de uma vez.

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